Mia Couto revisita os 50 anos de independência, recordando a dignidade reconquistada e os desafios atuais na construção de um país mais justo.
Mia Couto partilhou a sua experiência sobre a independência de Moçambique, reafirmando que a libertação do país é também a sua história pessoal. Recorda com sentimento o 25 de junho de 1975, quando o seu povo começou a trilhar um caminho de dignidade e reconhecimento.
Na altura, quando Moçambique emergia após anos em que a maioria dos moçambicanos era considerada indígena e invisível, o jovem jornalista de 19 anos já sentia o peso e o sonho de uma nação renascida. O autor relembra como, antes da independência, muitos cidadãos nem sequer dispunham dos recursos básicos, como calçado, o que simbolizava a marginalização a que eram submetidos.
Mesmo reconhecendo as limitações e os fracassos coletivos que se sucederam, Mia Couto mantém uma visão positiva. Para ele, o contraste entre o passado sem país e o presente, por mais imperfeito que seja, reflete um salto histórico em dignidade. O escritor, que também é biólogo e viveu períodos de grande violência, critica a precariedade das condições de vida e sublinha a importância de transformar as relações económicas, evitando que Moçambique e outros países africanos continuem a ser meros fornecedores de matérias-primas.
Mia Couto reconhece os desafios atuais, especialmente após os episódios de violência que seguiram as eleições de outubro de 2024, mas mantém a esperança nos sonhos que impulsionaram a independência: o desejo de ver um país com escola, saúde e condições de habitação para todos. Apesar de se autodenominar um "otimista sem esperança" face à realidade interna e ao contexto global, o autor afirma que as lições do passado são fundamentais para construir um futuro melhor.
Recorda ainda o dia memorável em que, por um atraso na chegada da comitiva de Samora Machel, acabou por integrar os notáveis que subiram ao palco para a proclamação da independência – um episódio que simboliza a inesperada sorte e o orgulho que unem o seu percurso pessoal à história de Moçambique.
Hoje, meio século depois daquele dia em que o país deixou para trás a marginalidade, Mia Couto reflete sem ressentimentos, valorizando as aprendizagens que o fizeram ser quem é e inspirando a todos a olhar para o futuro com coragem e realismo.