Alterações na Lei da Nacionalidade Levantam Questões Constitucionais
Alterações à lei migratória propostas pelo Governo geram preocupações sobre a sua conformidade com a Constituição, conforme alerta o constitucionalista Jorge Miranda.

Um parecer jurídico elaborado pelo constitucionalista Jorge Miranda, uma das figuras mais respeitadas na elaboração da Constituição portuguesa, e pelo advogado Rui Tavares Lanceiro, especialista em Direito Administrativo e Constitucional, expõe várias preocupações face às recentes modificações do Governo nas leis da nacionalidade e de estrangeiros, divulgadas pelo jornal Expresso.
Entre os pontos críticos, destaca-se a decisão de permitir que as alterações sejam aplicadas retroativamente a partir de 19 de junho, data em que o programa do Governo foi aprovado no Parlamento. O executivo argumenta que o anúncio provocou um aumento significativo de pedidos de nacionalidade por naturalização.
Contudo, Jorge Miranda aponta que as medidas ainda não estão em vigor, e a vontade do Governo de aplicar mudanças retroativamente "viola frontalmente a proibição de aplicação retroativa" de leis que limitam direitos, liberdades e garantias, além de representar uma "diminuição incompreensível da autonomia do Parlamento".
O parecer também avalia a proposta de endurecimento dos requisitos de residência em Portugal para a obtenção da cidadania, que passaria de cinco para 7 ou 10 anos, dependendo do estatuto dos imigrantes. O Governo planeia que o prazo comece a contar apenas a partir da concessão da autorização de residência, e não da entrega do pedido, o que poderá prolongar o tempo de espera indefinidamente.
Os especialistas consideram essa norma "constitucionalmente inadmissível", uma vez que compromete princípios de segurança jurídica, igualdade e dignidade humana, criando incertezas sobre o momento em que o prazo inicia, o que iria restringir o controle do cidadão sobre a sua situação.
Além disso, o parecer critica a limitação imposta pelo Governo ao direito de recorrer judicialmente contra decisões da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) no que se refere ao reagrupamento familiar, considerando-a "excessiva e violadora do princípio da proporcionalidade".
No que diz respeito à possibilidade de revogação da cidadania para naturalizados, os juristas levantam a preocupação de que tal medida "suscita a potencial violação" dos princípios de igualdade e proporcionalidade, criando uma distinção inadmissível entre cidadãos de origem e naturalizados.
Este parecer foi solicitado pelo escritório de advogados Liberty Legal, especializado em imigração e cidadania, e será submetido a grupos parlamentares e ao Presidente da República.