"Hepatites virais: um inimigo silencioso que requer atenção urgente"
As hepatites virais constituem uma ameaça silenciosa para a saúde pública. Joana Nunes, especialista na área, destaca a importância do rastreio e da educação sobre prevenção e tratamento.

As hepatites virais, resultantes de infeções por vírus A, B, C, D e E, afetam o fígado e representam um sério risco para a saúde global. Dentre elas, as hepatites B, C e D podem evoluir para formas crónicas, acarretando consequências severas como cirrose e cancro do fígado. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a erradicação das hepatites virais como um problema de saúde pública é um objetivo a ser alcançado até 2030.
A transmissão dessas hepatites, especialmente as B, C e D, pode ocorrer através do contacto com sangue contaminado, relações sexuais sem proteção ou da mãe para o filho durante a gestação ou parto. Este último formato é particularmente preocupante em nações que não realizam rastreios maternos, onde mais de 90% das crianças infetadas ao nascer mantêm o vírus durante toda a vida.
Em território português, a transmissão é mais frequente entre os adultos, não se restringindo a populações consideradas de risco, como os utilizadores de drogas injetáveis ou homens que têm sexo com homens. Curiosamente, cerca de um terço dos casos de hepatite C ocorre em indivíduos que não apresentam fatores de risco evidentes.
As hepatites virais são frequentemente designadas como "silenciosas", uma vez que muitos dos sintomas só se manifestam tardiamente, quando já existe dano no fígado. Por essa razão, uma grande parte das pessoas portadoras do vírus desconhece a sua condição. Estima-se que apenas 13% das pessoas infetadas com hepatite B e 36% com hepatite C tenham recebido diagnóstico.
O rastreio é, por isso, absolutamente essencial, incluindo para aqueles que não têm fatores de risco identificáveis. A Direção-Geral da Saúde recomenda que todos os adultos realizem, pelo menos uma vez na vida, o teste para hepatite B (AgHBs) e hepatite C (anti-VHC).
Como é que podemos combater as hepatites?
- Prevenção: Portugal apresenta uma das melhores taxas de vacinação contra a hepatite B, com 99% dos recém-nascidos recebendo a primeira dose. Embora a hepatite C não disponha de vacina, medidas como a troca de seringas e o uso de preservativos são cruciais.
- Diagnóstico: A ausência de rastreio universal é um dos principais obstáculos. Apesar de os testes estarem disponíveis, muitos indivíduos não são testados devido à falta de informação ou motivação.
- Tratamento: A hepatite C é curável em 2 a 3 meses através de medicamentos seguros e eficazes. Já a hepatite B, embora não tenha cura, pode ser controlada com o uso de medicação específica.
Outro desafio a enfrentar é o estigma associado a essas condições. A discriminação ainda é prevalente, resultando de desinformação. É importante salientar que as hepatites B e C não são transmitidas através de contactos casuais, como beijos ou apertos de mão. Casos de avós excluídos do cuidado dos netos ou trabalhadores despedidos após revelar o diagnóstico ilustram a necessidade de aumentar a literacia em saúde para combater preconceitos.
Portanto, é vital que cada pessoa realize o rastreio para hepatites B e C pelo menos uma vez na vida, mesmo na ausência de sintomas ou fatores de risco claros. Assegure-se também de que está vacinado contra as hepatites A e B, pois a vacinação representa uma das estratégias mais eficazes de prevenção. Além disso, incentive conversas abertas sobre o tema com familiares, amigos e colegas; informar é a melhor maneira de desmantelar o estigma e a discriminação que cercam essas infecções.